Nas pesquisas, Bolsonaro aparece
na frente na corrida eleitoral em todos os cenários sem Lula | Foto: Fábio
Rodrigues Pozzebom/Ag. Brasil
Agora que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva
foi condenado criminalmente em segunda instância e pode ser barrado da disputa
presidencial de 2018 pela Lei da Ficha Limpa, o deputado federal Jair Bolsonaro
(PSC-RJ) desponta como principal nome a substituir o petista na liderança das
intenções de voto.
Segundo pesquisa do instituto Datafolha divulgada depois da segunda condenação de Lula, sem Lula na corrida, o parlamentar chega a liderar com 20%
das intenções de voto no primeiro turno.
Nesse novo cenário, o que pode beneficiar e prejudicar
o pré-candidato? Das consequências de se candidatar por uma sigla
"nanica" até o apoio de uma militância motivada principalmente nas
redes sociais, veja abaixo a análise de alguns dos fatores que podem
influenciar a opinião pública a oito meses das eleições em 7 de outubro.
1. Pouco
tempo de TV
Bolsonaro, hoje no PSC (Partido Social Cristão),
anunciou sua intenção de se filiar ao PSL (Partido Social Liberal) para
concorrer à Presidência da República. Até agora, nenhum outro partido confirmou
que pretende se coligar à legenda.
Conseguir apoio de outras siglas, principalmente
das maiores, é importante porque a distribuição de dinheiro público para
campanha e do tempo de propaganda na TV é proporcional ao tamanho das bancadas
na Câmara dos Deputados, observa o cientista político Geraldo Tadeu Monteiro,
professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).
São fórmulas que dependem do número de deputados
eleitos ou do número de votos obtidos na eleição anterior. E o PSL elegeu
apenas dois deputados em 2014. O cálculo sobre o tempo de TV na eleição
presidencial dependerá de quantos candidatos vão concorrer e com que
coligações, mas, pelas regras atuais, é improvável que o partido tenha mais que
15 segundos de cada bloco de 12 minutos e meio de propaganda (serão seis blocos
por semana, durante 35 dias de campanha).
"Isso pesa porque, se ele estiver bem nas
pesquisas, é inevitável que sofra ataques. E o ataque massivo requer respostas.
Ele não vai ter tempo de televisão nem para apresentar proposta, nem para se
defender", afirma o cientista político Jairo Pimentel, pesquisador da FGV.
A variável sem resposta nesta análise é o papel que
a propaganda de TV tradicional terá em uma opinião pública cada vez mais
conectada às redes sociais.
Impacto da possível saída de Lula da
corrida presidencial ainda é incerto | Fotos: José Cruz/Ag. Brasil
2. Menos de
1% dos recursos do fundo partidário
Quanto aos recursos disponíveis para o partido, em
janeiro, por exemplo, quando foram distribuídos R$ 63 milhões do fundo
partidário às legendas, o PSL recebeu apenas R$ 538 mil, menos de 1% do total.
Para efeitos de comparação, os partidos que tiveram maiores repasses foram PT
(R$ 8,4 milhões), PSDB (R$ 7,1 milhões) e PMDB (R$ 6,9 milhões).
Valores semelhantes devem ser distribuídos
mensalmente ao longo do ano, e mais R$ 1,7 bilhão será repassado aos partidos
exclusivamente para os gastos com campanha, numa divisão também proporcional ao
tamanho das siglas na Câmara dos Deputados.
O dinheiro público será o principal recurso para
financiar a divulgação dos candidatos, tendo em vista que as doações de
empresas estão proibidas. Já as doações de pessoas físicas estão liberadas.
Ainda não está claro, no entanto, se o forte apoio
a Bolsonaro pode se reverter em contribuição financeira para a campanha, algo
ainda incomum no Brasil.
3. 'Infantaria'
Além de garantir mais dinheiro, a aliança com
outras legendas é essencial para ampliar a estrutura da campanha nacionalmente,
reforça Monteiro. Quanto maior a coligação, a tendência é que o candidato a
presidente tenha mais apoiadores nos Estados, concorrendo a cargos de
governador, senador e deputado estadual e federal, pedindo votos também para
ele.
"Na hora em que a campanha vai para rua, o que
ganha guerra é a infantaria. É ter um candidato estadual pedindo voto para
você, o cara que vai no rincão, na comunidade. São os partidos com mais
estrutura nacional que, em geral, levam seus candidatos para o segundo
turno", observa o professor da Uerj.
"Isso faz diferença principalmente numa
campanha nacional, em um país como o nosso, de dimensões continentais",
concorda a cientista política Rosemary Segurado, professora da Fundação Escola
de Sociologia e Política de São Paulo.
Uma questão ainda sem resposta é o quanto os
eleitores ainda estarão abertos à influência de políticos em um período de
forte descrença na classe.
Getty Images Especialistas
apontam pouco tempo de propaganda eleitoral na TV como desafio para a
candidatura de Bolsonaro
4.
Militância ativa
Jamil Marques, professor do departamento de ciência
política da Universidade Federal do Paraná (UFPR), também considera a falta de
capilaridade nacional do PSL um problema para Bolsonaro, mas acredita que o
fato de o candidato ter uma militância mais engajada pode compensar em parte
essa deficiência.
"A militância mais apaixonada tem uma papel
fundamental, mas não sei se consegue suprir por completo a falta de
capilaridade da campanha, porque sua atuação tende a ser menos organizada que a
dos partidos", pondera.
O deputado tem viajado pelo país e comumente é
recebido por grupos de simpatizantes entusiasmados em atos gravados em vídeo e
posteriormente postados nas redes sociais, alavancando o impacto do apoio.
A página do deputado no Facebook na quarta-feira,
por exemplo, anunciava a chegada de Bolsonaro e um de seus filhos, que também é
deputado, a Cascavel, no Paraná.
Chegada ao aeroporto às 15h30, anuncia o post
compartilhado por mais de mil pessoas. "Tenho certeza de que todo o oeste
paraense o receberá de braços abertos!!!", diz uma internauta. "Moro
na cidade do Crato, Ceará. Gostaria muito de conhecer de perto e se for
possível, fazer uma selfie com meu presidente Jair Messias Bolsonaro",
escreve outro. "E quando vem a Altamira, Pará?", pergunta uma
terceira, mostrando a capilaridade regional que o pré-candidato tem conseguido
alcançar.
5. Força nas
redes sociais
Autor do livro Do Clique à Urna: Internet, Redes
Sociais e Eleições no Brasil, Jamil Marques também considera que, com uma
boa estratégia de comunicação, Bolsonaro pode compensar em parte a falta de
tempo de TV. Além disso, nota ele, é comum que o conteúdo que circula nas redes
sociais acabe repercutindo nos veículos de televisão e rádio, chegando a
pessoas mais velhas ou em áreas mais remotas, cujo o uso de internet tende a
ser menor.
"A equipe do Bolsonaro precisa pensar em
estratégias para esses jovens de 20 anos que acessam internet e estão dispostos
a repercutir sua campanha, mas também terá que criar material que chegará ao
WhatsApp, aos grupos de família, atingindo pessoas de 40, 50, 60 anos",
afirma.
Distribuição do fundo eleitoral
segue divisão proporcional ao tamanho das siglas na Câmara | Foto: Elza
Fiúza/Ag. Brasil
A força de Bolsonaro nas redes não viria apenas de
ações organizadas por sua campanha, mas de uma militância engajada em plataformas
como o Facebook e o WhatsApp.
Segundo o Datafolha, o eleitor de Bolsonaro é o
mais é o que mais dissemina conteúdo político nessas plataformas. Do total, 93%
têm conta no WhatsApp. Entre eles, 43% disseram disseminar conteúdo ali.
6. Limites
do discurso radical e do antilulismo
Segundo analistas ouvidos pela BBC Brasil, a força
de Bolsonaro vêm do seu discurso anticorrupção e de combate a violência, temas
que têm despertado especial preocupação entre os brasileiros. Além disso, sua
ascensão acompanha um movimento global de fortalecimento de forças
conservadoras, nota Rosemary Segurado.
No entanto, o radicalismo do seu discurso tenderia
a afastar o eleitor mais moderado, afirmam os cientistas políticos. Após
apresentar contínuo crescimento do deputado, a última pesquisa Datafolha
mostrou Bolsonaro estacionado entre 16% e 20%, a depender de que outros nomes
estarão na disputa. Nos cenários sem Lula, a maioria dos votos do petista se
distribui entre Marina Silva (Rede) e Ciro Gomes (PDT).
Outra pesquisa do Datafolha, divulgada em julho
passado, indicou que 10% do eleitorado brasileiro está alinhado com pensamentos
de direita e outros 30% são de centro-direita.
"Me parece que ele já está chegando no seu
teto, no limite desse perfil de eleitorado mais conservador. E ele tem se
fortalecido num ambiente de muita polarização, colocando-se como o anti-Lula.
Mas, se Lula sair da disputa, esse discurso perde fôlego", acredita a
professora.
Em foto de 2016, Bolsonaro
discute na Câmara; radicalismo de seu discurso tende a afastar eleitor mais
moderado | Foto: Marcelo Camargo/Ag. Brasil
7.
Pulverização
Jairo Pimentel considera que a chance de Bolsonaro
chegar ao segundo turno aumenta se a eleição ficar muito pulverizada, com
vários candidatos competitivos. Isso dividiria os votos, permitindo que o
deputado passasse para a etapa seguinte mesmo sem conseguir ultrapassar muito o
suposto patamar que define o voto mais conservador no Brasil, em cerca de 20%,
segundo as pesquisas.
Nesse caso, afirma, seu potencial de vitória
dependerá, em parte, dos níveis de rejeição à sua candidatura e à de seu
adversário no segundo turno. Os níveis de rejeição de Bolsonaro ficam hoje em
torno de 50%.
O Datafolha mediu três cenários com Bolsonaro no
segundo turno - a pesquisa indica que se a eleição fosse hoje ele perderia para
Lula (49% a 32%) e Marina Silva (42% a 32%) e ficaria atrás, mas tecnicamente
empatado dentro da margem de erro, com Geraldo Alckmin, provável candidato do
PSDB (35% a 33%).
8. Bolsonaro
paz e amor?
Um possível fator que poderia beneficiar a
candidatura de Bolsonaro seria a adoção de um discurso mais moderado que,
claramente, se distancie de pronunciamentos radicais sobre temas como a
ditadura.
Da mesma maneira que seu apoio cresce graças as
redes, é também como consequência dos "virais" que parte do público
desenvolve sua rejeição ao político.
"Só vai mudar, infelizmente, quando nós
partirmos para uma guerra civil aqui dentro. E fazendo um trabalho que o regime
militar não fez, matando uns 30 mil! Começando com FHC! Não deixa ele de fora
não!", diz o trecho de uma entrevista com ele, então deputado pelo antigo
Partido Progressista Reformador (PPR). A gravação foi ao ar na TV Bandeirantes
do Rio de Janeiro, em 1999, e viralizou na internet este ano.
"No segundo turno, o tempo de televisão é
igual para os dois candidatos. Então, qual vai ser o tom adotado? Vai ser
Bolsonaro paz e amor para diminuir a rejeição?", questiona Jairo Pimentel.
As consequências de uma moderação, no entanto, não
estão claras, uma vez que é justamente sua postura radical em certos temas que
atrai parte do eleitorado.
Bolsonaro e o presidente do PSL, o deputado federal
Luciano Bivar (PE), não atenderam aos pedidos de entrevista até a publicação
desta reportagem.
Fonte:
BBC Brasil