De menino refugiado
a bilionário mais jovem da África
Muitos
empreendedores de sucesso superaram diculdades para subir na vida, mas poucos
passaram pelos mesmos horrores que Ashish Thakkar e sua família.
Thakkar,
de 34 anos, é hoje o fundador e chefe do conglomerado Mara, que atua em 21
países, a grande maioria na África.
Ele
emprega 11 mil pessoas, é considerado o bilionário mais jovem da África e tem
uma fundação que ajuda pequenos empreendedores, além de ser consultor da ONU e
de vários países da África na área de empreendedorismo.
Mas,
ao 12 anos, teve que fugir do genocídio em Ruanda com sua família.
Ele
estudava em um colégio interno no Quênia, mas estava de férias e foi visitar a
família em Ruanda, em 1994, um dia antes do assassinato do presidente do país -
ele morreu na queda de um avião derrubado em um atentado -, que acabou dando
início ao massacre que chocou o mundo.
Thakkar
conta que nesse dia estava no Hotel Ruanda, que ficou famoso após o filme de
Hollywood, mas apenas passando o dia, como turista. Mesmo após a morte do
presidente, foi com a família para casa, porque todos achavam que os tumultos
durariam um ou dois dias.
Alguns
dias depois, porém, um tio chegou com integrantes de forças da ONU e levou toda
a família de volta para o hotel, onde ele e outras cerca de 1.200 pessoas se
refugiaram.
Thakkar fugiu com
família do genocídio de Ruanda
"Havia
corpos na rua, barulho de tiros e explosões o tempo todo. Mas por sorte
conseguimos sair de lá vivos", diz ele.
"Isso
me ensinou que há muitas coisas na vida, que a gente tem que devolver o que o
mundo nos dá, e temos que garantir que uma coisa como essa nunca volte a
ocorrer. Como eu, como indivíduo, posso garantir isso? Cada um tem que fazer
sua parte, mesmo que pequena."
Ao
fugir, porém, seu pais perderam tudo o que tinham. Não era a primeira vez: eles
já haviam tido que reconstruir a vida quando foram expulsos de Uganda - país
vizinho a Ruanda - em 1972.
Naquele
ano, o ditador Idi Amin expulsou mais de 50 mil pessoas de origem asiática
(indianos, bengalis, paquistaneses ou cingaleses). Naquela ocasião, eles foram
para a Inglaterra, sem nada.
O
pai começou a trabalhar na fábrica da Ford em Leicester e a mãe em uma fábrica
de batatas fritas. Juntaram dinheiro, abriram um negócio e envolveram os filhos
no trabalho de forma lúdica.
"Eles
faziam como se fosse um jogo, nos davam objetivos, e isso tornava tudo
divertido", conta.
Disquetes foram importantes no início da carreira de Thakkar
Depois
de um tempo, eles resolveram se mudar para Ruanda - os pais repetiram esse
estilo de jogos, conta, quando estavam no Hotel Ruanda, para que os filhos não
sentissem tanto o horror do que estava acontecendo.
Mas,
para Thakkar, o empreendedorismo de sua família e principalmente a forma
positiva como lidavam com problemas o influenciaram muito para que entrasse no
mundo dos negócios.
Após
fugir de Ruanda, eles voltaram para Uganda.
Computador
A
vida de Thakkar começou a mudar quando, após muita insistência, ele ganhou um
computador dos pais.
Um
dia, um amigo da família foi jantar e se encantou com o computador.
Prontamente, Thakkar disse que tinha uma aparelho extra e estava vendendo a
máquina - o que era mentira. Deletou seus arquivos do PC e entregou o aparelho
no dia seguinte, lucrando US$ 100.
Depois
disso, conveceu os pais a deixarem que ele alugasse uma loja por dois meses,
nas férias de verão, para montar um negócio. Consegiu um empréstimo de US$ 5
mil e passou a revender equipamentos e acessórios para computador, como
disquetes, que comprava em Dubai.
No
fim das férias, não contou aos pais que as aulas haviam recomeçado - não queria
voltar. Explicou que, mesmo se completasse os estudos, queria continuar
trabalhando como empreendedor, e pediu que lhe dessem uma chance.
O grupo Mara tem
negócios na área de agricultura, tecnologia, bancos, infraestrutura e imóveis
Os
pais entraram em um acordo com ele: se o negócio não desse certo, ele teria que
retornar no ano seguinte. "Mas não voltei até hoje", conta.
Depois
de convencer seus pais, ele passou a ampliar seus negócios. Em vez de importar
equipamentos para vendê-los em Uganda, ele abriu um escritório em Dubai e
começou a vender para empresas em vários países africanos.
Desde
então, o grupo Mara se diversificou. Hoje abriga negócios variados, provê
infraestrutura para empresas de telecomunicação, produz embalagens, têm bancos,
hotéis, centros de conferência, shopping centers, fábricas de papel e milhares
de hectares de terras usadas em agricultura.
Escola e apoio
Thakkar
tem orgulho de ter deixado a escola - em seu perfil do Twitter, escreve, em sua
descrição, que largou a escola. Mas isso significa que ele é contra a educação
formal?
"Não.
Acho que ela é extremamente importante. Mas também acho muito importante o
ângulo da educação informal, de ter um tutor, um apoio", conta. "Isso
que fazemos na fundação."
A
Fundação Mara dá orientação e apoia a pessoas que estão começando seus
negócios.
Tem
como base, principalmente, Uganda, Tanzânia e Nigéria. Desde seu lançamento, em
2009, já ajudou mais de 160 mil pequenos empresários.
Outra
coisa que aparece em seu perfil do Twitter é "refugiado".
"Isso faz parte de mim todos os dias. Quando
você não tem um país, você vê que não pode depender de Estados, que nós como
indivíduos somos como o setor privado, temos que fazer algo também. Se
empoderarmos as pessoas, se criarmos oportunidades para elas, muitas coisas,
como o genocídio (de Ruanda), não aconteceriam", afirma.
Fundação
Apesar de ser considerado "o bilionário mais
jovem da África", Thakkar, hoje com 34 anos, diz que o objetivo maior do
seu trabalho não é enriquecer.
Ele afirma que gasta entre um quarto e um terço de
seu tempo com a fundação e outros projetos no setor de políticas públicas.
Já a parte comercial de seu negócio - onde também
trabalha toda a sua família - ocupa o resto do tempo. Ele passa 20 dias por mês
viajando - sem jatinho particular - e diz que evita levar o assunto trabalho
"para a mesa do café da manhã".
Mas ele também aproveita sua fortuna: tem como
hobby fazer paraquedismo e está inscrito no programa que vai levar os primeiro
turistas a Marte.
"Estou fazendo treinamento e estou confiante
que iremos logo para o espaço", diz.
Ele afirma, porém, que ama seu trabalho e que seu
sonho "é ver a África sustentável".
"Eu tenho 34 anos, em agosto faço 35, e a Mara
faz 20. Mas sinto que ainda não mudamos nada, somos uma gota no oceano. Agora
que tudo vai começar."
Fonte: BBC Brasil
Gaspar Moura dos Santos