Governador de São Paulo, presidente da Câmara dos
Deputados e ministro da Fazenda são nomes cogitados para as próximas eleições |
Fotos: Reuters/Câmara dos Deputados
Busca-se um candidato de centro: a nove meses da
eleição presidencial, a viabilização de uma candidatura que aglutine forças
"moderadas" tem sido tópico frequente do debate político brasileiro.
Os que defendem isso dizem ser necessária a união das
"forças não extremadas" (termo usado pelo ex-presidente Fernando
Henrique Cardoso, do PSDB, em artigo recente) como alternativa aos dois líderes
nas pesquisas de intenção de voto, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva
(PT) e o deputado federal Jair Bolsonaro (PSL). Nomes identificados com o
liberalismo econômico, uma bandeira tradicionalmente de direita, têm postulado
essa posição.
É o caso do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles
(PSD), com longa carreira no mercado financeiro até se tornar presidente do
Banco Central no governo Lula (2003-2010), do presidente da Câmara, Rodrigo
Maia (DEM), e do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB).
Já Marina Silva, que buscou se apresentar como
"terceira via" entre PT e PSDB em 2014 e agora é pré-candidata da
Rede, tem sido menos citada, mas foi lembrada no artigo de FHC como outro nome
possível.
Tal discussão levanta questionamentos: o que,
afinal, seria o centro na política brasileira? E Lula representaria um radical
de esquerda, exato oposto do radical de direita Bolsonaro?
Centro,
lugar indefinido
imagem Reuters Petista e seu partido radicalizam
discurso à esquerda, apontam analistas
Para analistas políticos ouvidos pela BBC Brasil, o
"centro" é um lugar dinâmico que se define dentro da disputa
eleitoral, a depender de quão à esquerda ou à direita estão os candidatos.
Nesse sentido, o fato de Lula e Bolsonaro no
momento polarizarem as intenções de voto abre caminho para que outros
concorrentes usem o espaço "entre" eles como estratégia eleitoral.
Isso não significa, porém, que os dois ocupem os "exatos opostos" do
espectro político, nem que nomes como Alckmin, Meirelles e Maia estejam no
"centro exato" entre os dois.
"A estratégia desses nomes (que se colocam
como centro) é radicalizar e reificar o que significa Lula e Bolsonaro. É muito
mais uma resposta racional à estrutura da competição atual do que propriamente
uma consistência ideológica", afirma o cientista político Rafael Cortez,
da Consultoria Tendências.
Em recente entrevista ao jornal O Globo, Maia
defendeu que "o centro não é um ponto entre direita e esquerda, ou seja,
um meio do caminho entre o Bolsonaro e o Lula. (…) Centro é onde vai se
dialogar com a sociedade".
O que é
esquerda e direita?
Cortez considera que há dois eixos principais que servem
de termômetro para o quão um candidato é de esquerda ou direita - os candidatos
de centro são aqueles entre os que tendem mais claramente para um dos polos.
Um desses eixos identifica o posicionamento em
relação à "questão redistributiva".
No extremo à esquerda, está a visão de que a melhor
forma de gerar igualdade é por meio da atuação do Estado, que deveria corrigir
as injustiças criadas pelo mercado. Já no outro extremo, da direita, ficam os
que acreditam que o mercado é a melhor mecanismo de regular a distribuição de
bem-estar, de acordo com as decisões e méritos individuais, evitando que grupos
dentro do Estado capturem recursos para si.
imagem Reuters Para Rafael
Cortez, não está clara a posição de Bolsonaro sobre a 'questão redistributiva'
"O grosso da discussão na política brasileira
vinha se dando em torno do eixo redistributivo, com o PT assumindo a defesa de
maior peso do Estado e o PSDB com discurso mais liberal. Na eleição de 2014,
Marina aparecia como algo intermediário, combinando em seu discurso uma certa
responsabilidade do ponto de vista econômico, mas ainda dando peso a valores
igualitários", lembra Cortez.
"Agora, para 2018, outra dimensão vem ganhando
relevância, o eixo dos valores, e é por isso que está mais difícil definir o
centro", ressalta.
Nesse segundo eixo apontado por Cortez, em uma das
pontas fica a visão mais progressista, que defende uma clara divisão entre
Estado e questões morais e religiosas. Já na outra ponta estão os
conservadores, que têm uma postura mais moralista quanto às liberdades
individuais.
O primeiro grupo em geral defende, por exemplo, os
direitos humanos e a legalização do aborto, das drogas e do casamento
homossexual. Já o segundo costuma combater essas propostas e apoiar um Estado
mais repressor.
No Brasil, as visões progressistas costumam estar
mais associadas à esquerda e as conservadoras, à direita.
"O Bolsonaro não emerge a partir da discussão
redistributiva, mas recuperando supostos valores que teriam sido perdidos em função
de práticas de corrupção. Ele chama atenção para uma suposta desconexão entre
reais valores da sociedade e o comportamento da classe política", nota
Cortez.
"É aí que vemos também discussões sobre
ideologia de gênero, escola sem partido, o papel das forças armadas",
exemplifica.
Já no "eixo redistributivo", não está
clara qual é a posição de Bolsonaro. Embora ele venha tentando se associar ao
liberalismo econômico, os analistas ouvidos pela BBC Brasil o consideram uma
incógnita nesse campo.
"Na sua carreira como deputado, os projetos
que apresentou eram muito corporativistas, atendendo interesses dos militares,
e isso vai contra os princípios do liberalismo", afirma Cortez.
imagem Reuters Ex-senadora é
pré-candidata pela Rede para sua terceira eleição presidencial seguida
Alckmin,
Meirelles e Maia são centro?
Os atores políticos tendem a transitar por esses
"eixos" ao longo do tempo, mudando sua postura de acordo com a
própria dinâmica da disputa político-eleitoral.
Vejamos o caso do PSDB, por exemplo, do
pré-candidato Alckmin. Segundo a pesquisadora da FGV Lara Mesquita, o partido
nasce como uma legenda de centro-esquerda - e isso fica claro nas posturas
adotadas na Assembleia Constituinte (1987-1988).
Durante os governos Itamar Franco (1992-1994) e FHC
(1995-2002), porém, com a implementação do Plano Real para debelar a
hiperinflação, o PSDB vai se deslocando para a direita, ao adotar políticas
econômicas neoliberais.
E mais recentemente, nota Cortez, o partido também
passou a flertar com um maior conservadorismo no campo dos valores, por exemplo
com a filiação de parlamentares como o deputado estadual Coronel Telhada (SP),
que já deu declarações como "direitos humanos é para defender a pessoa,
não para defender bandido".
E, assim como o PSDB se deslocou para o liberalismo
e o conservadorismo, o PT também se movimentou para a direita, observa o
analista da Tendências: o partido, inicialmente associado ao
"socialismo", passou a ocupar o espaço de legenda
"social-democrata" que era dos tucanos.
"Os governos Lula nunca foram de esquerda.
Eram governos que faziam parte de uma aliança muita ampla que iam da
centro-direita até a esquerda. E do ponto de vista redistributivo, foi um
governo que subsidiou o capital muito mais do que fez política social",
avalia o sociólogo Sérgio Abranches, conhecido por ter cunhado o termo
"presidencialismo de coalizão" para classificar o sistema político
brasileiro.
Na visão de Mesquita, Lula e o PT voltaram a radicalizar
o discurso à esquerda - por exemplo com forte oposição à Reforma da
Previdência, medida que o próprio governo Dilma Rousseff chegou a defender -
como uma estratégia de recuperar suas bases (movimentos sociais e sindicais,
por exemplo) após o desgaste sofrido com a operação Lava Jato e o impeachment.
Nesse novo contexto, a pesquisadora da FGV
considera correto classificar Alckmin, Meirelles e Maia como possíveis
candidatos de centro. "São nomes que estão à esquerda de Bolsonaro e à
direita de Lula", afirma.
Situação jurídica de Lula gera
incertezas sobre o cenário eleitoral para 2018 | Foto: Elza Fiúza/ABr
Já para Abranches, os três representam a
continuidade do governo Temer, uma administração conservadora "de homens
brancos" cuja única agenda é a econômica. O sociólogo classifica todos
como centro-direita.
Na sua avaliação, o debate atual está confundindo a
posição de "centro" com o governo Temer.
"Digo centro-direita porque tem o Bolsonaro.
Se ele estiver na disputa, ele define a extrema-direita, por seu viés
autoritário. Com isso, o Temer se desloca para a centro-direita. O Bolsonaro
ajuda o Temer, nesse ponto de vista", ressalta.
Para Abranches, o deputado é uma figura menor da
política brasileira. "Eu diria que todo mundo polariza com o Bolsonaro,
pois ele representa uma volta ao passado autoritário", completa.
O sociólogo acredita que a candidatura do deputado
tende a perder fôlego. Se isso acontecer, afirma, a eleição deve se polarizar
entre um candidato de centro-direita que represente o governo Temer e outro de
centro-esquerda, que pode vir a ser Lula, caso consiga evitar ser barrado pela
Lei da Ficha.
Se for condenado em segunda instância no caso do
tríplex do Guarujá no julgamento previsto para ser realizado pelo Tribunal
Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) a partir do próximo dia 24, o petista
dependerá de recursos para poder concorrer
Fonte: BBC Brasil